sábado, 24 de setembro de 2011

Mementos

Ontem recuperei um fragmento
d'um esquecido momento.
Ontem sonhei com o passado.
Vi um menino de burro amarrado.
Numa carruagem do metro sentado
olhava através do vidro a seu lado.
E ele parecia muito triste
mas, na verdade, não o estava.
Com o que na sua vida não consiste
já ele muito sonhava.
Aquele menino acreditava
que, para o seu anjo o encontrar,
ou uma cara triste esboçava
ou o anjo não saberia quem salvar.
Ele tanto o praticou
que mestre se tornou.
Mas o anjo não chegou
Não o salvou.
E o tempo passou
O mestre do triste
sua vida continuou
Que o anjo não existe
até ele já acreditou.
Mas ontem lá se lembrou...
Será que tenho de o salvar?
E nasceu algo para acreditar

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Tento viver um dia
depois de um dia,
mas não consigo.
Ai tempo! E eu que te achava amigo...
Sento-me numa sala vazia
onde o meu amor jamais caberia
e deixo-o à porta.
Ai cabeça! Que és tão torta...
Desconhecendo o futuro vizinho
vou apreciando estar sozinho
e vou fazendo girar o meu moinho.
Ai que mentirosas verdades!
Que dolorosas saudades
das horrorosas beldades
que, temo, não me temem...
E, mesmo que vá ao extremo,
cenas não acontecem.
E coisas obscenas nesta tola
não se acometem.
Apenas me derretem,
com um fervor ardente
que me assola o peito,
me recusa uma linha de pensamento direito
e me usa para meu desproveito.
Ai mente dormente!
Pára de me fazer frente,
que eu fico sem jeito...

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Ser poeta

Todos somos o poeta,
porque todos procuramos
alcançar a mesma meta.
Todos nós amamos
a bela harmonia
que nas palavras encontramos,
tal como entre a noite e o dia.
Todos nós desejamos
a mais doce sinfonia
entre corpos, mentes e almas.
Todos queremos sentir essa magia,
e a esse espetáculo bater palmas,
celebrando, cheios de euforia,
cheios de emoção e de energia,
o amor pela vida,
por toda e qualquer via.
Todos procuramos
duas semelhantes vibrações,
quer as sintamos
com um só sentido,
ou também com os corações.
Todos rimamos.
Somos poetas de fusões.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

(desa)bafos quentes

Depois de tudo
aquilo que já passei
ainda me consigo achar sortudo.
Ainda me consigo sentir rei.
É certo que raínha
não tenho a meu lado.
É a enorme graínha
que me deixa engasgado.
Mas isso não será minha morte.
Só eu defino a minha sorte,
que me traçará rumo a bom norte.
Seguirei com o meu porte.
Porque o que quero
é transportar (e transbordar) amor.
Não sei porque espero
que o mundo se encha de cor.
Afinal não se pode encher
o que já se encontra cheio.
E eu apenas posso colher
aquilo que semeio.
Muito do que semeei
já deixei apodrecer.
Mas desta vez sei
o que fazer.
O Sol, que vive neste peito,
mais forte está a crescer.
Mais chamas a arder eu vejo.
Nada mais preciso para me vencer.

Tento sempre ser querido,
embora raramente me sinta por alguém.
Quero muito ser querido,
mesmo quando não quero ninguém.
Tanto amor querido,
e o meu não reservei.
Agora o sentimento querido
é amar-me como um dia amei.
E a voz que me sussura ao ouvido
nunca mais escutarei.
Agora o discurso querido
é que, para sempre, assim viverei.

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Encontros

Vai aos pulos, a passear,
como em tantos outros dias,
quando vê, a passar,
a deusa das tristezas e alegrias.
Pára, atónito
sem compreender
o propósito
de a ver.
Fica-se, paralizado,
sem o conceber.
Sem pensamento formado
nem movimento iniciado.
Os neurónios atrofiam-se
com meias ideias,
e elas contrariam-se.
Só após as suas
mentais diarreias
lhe inundarem as ruas
da sua mente,
ele entende,
de repente,
uma verdade
diferente.
Na realidade
ele estava
a sonhar.
Sua deusa não era
quem ele avistava.
O seu pensar
a percepção adultera.
Mas como a pode ele achar,
se dela está à espera?

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Quando o teu corpo me toca,
e a cabeça me provoca
com desejos que teimo não aceitar,
é como se fosse alvejado.
Tanto ar suspirado...
é como se estivesse a vazar.
Jamais diria alguém
que me sinto tão bem
por te encostares a mim.
E não mais o direi,
e nunca o admitirei,
embora me doa amar assim.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

A viagem

A viagem que nos une...
O teu doce perfume...
Podes dizer que não é a tua pele,
mas parece-me mais suave que o mel.
E um perfume cheira
em cada um de diferente maneira...
Como hei-de adormecer,
se me sinto a endoidecer?
Este movimento que nos embala
é oposto pela proximidade da tua alma...
Aqui, do meu lado, serena.
Mas vou tentar não pensar nisso demasiado.
Quero apreciar cada minuto e cada teu bocado.
Não sei se consigo ficar parado
no pensamento, mas quero ter o cuidado
de me divertir a todo o momento.
E fazer-te sorrir será o único alimento
que desejo que me satisfaça.
Bora lá giraça!

A tempo

Tanto corres atrás dum tempo,
que não se vê e não se sente,
que sempre deixas fugir o momento...
o único que importa... presente.
Esperas por um amanhã que nunca existirá,
que nunca chegará,
que nunca à porta te baterá.
Porque sempre agora será.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

O Ano da Fada

No início dos tempos
apenas uma fada existia.
Pairava, apanhando momentos,
cheia de graça e alegria.
Saltitava por todo o lado,
como a mais inocente menina,
e tornava o mundo encantado,
com os seus olhos de felina.
Quando ela dançava
não faltavam espectadores.
Todos ela hipnotizava...
Pessoas, animais, e até flores.
Por ela tão fascinadas...
nem as cores lhe resistiam.
E nas suas asas douradas
todas se reflectiam.
A poeira luminosa e mágica,
que suavemente emanava,
é hoje uma recordação nostálgica
de uma passado que não passava...
... Mas que passou.
Outros tempos se passaram
desde que aquela fada hibernou.
Outras histórias se contaram,
mas mais nenhuma me interessou.
Nada me parece mais belo
que o tempo em que a fada voou.
Isso posso prometê-lo.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

D. Maria Pulguinha

Socialmente incorrecto
é o meu dialecto
e temos pena
se a paciência é pequena
para ouvir minhas loucas verdades.
Todos vivemos em paralelas realidades.
A maioria recheada
de indecentes decências
ou, então, mascarada
com falsas inocências.
Comportaste como se não fosse nada
mas andas bem enganada.
Até parece que queres
merecer o teu lugar no inferno
com as tantas almas que feres.
E da tua desgraça
ergues o teu governo.
És como uma traça,
a esburacar a nossa protecção.
Se calhar já andas a dar graxa
ao teu futuro patrão.
Deves andas a trabalhar
para uma suite com colchão,
ao lado da câmara de tortura
que, em tua honra, construirão.
Lá não acabará a fartura
do sofrimento que tanto amas.
Bem tento, mas não compreendo
porque queres uma casa em chamas.
Cá eu só me arrependo
de não ter começado a lutar
contigo antes de te encontrar.
Bem podes procurar abrigo.
Eu vou-te caçar.
O Diabo pode ser teu amigo.
Deus do meu lado há-de estar.
A escuridão é mais rápida que a luz,
mas esse tipo de adrenalina não me seduz.
Sou o único vidente da minha sina.
Por isso, prepara-te para a chacina.